terça-feira, 7 de setembro de 2010

TAMPA, FLÓRIDA


Por que afinal os homens não abaixam a tampa?

Toda a polêmica sobre a tampa do vaso sanitário repousa sobre o momento em que o indivíduo, não importa o gênero, vai ao lavabo a fim de resolver suas necessidades fisiológicas de número um.

Porque o número dois todo mundo faz sentado.

Por que homens simplesmente não abaixam a tampa? O que parece insondável é, na verdade, como na maioria das vezes, apenas um objeto pousado no exato meio do caminho.

Um homem que se aproxime de um vaso a fim de aliviar a água dos joelhos vai fatalmente levantar ambas as tampas. Faz isso por dois motivos: não deseja regar a tampa superior e considera ainda os afetos e nojos das companheiras mulheres, evitando assim que seu líquido dourado permaneça na inferior e umidifique as coxas alheias.

Sim, é claro; fosse em casa, levantaria ambas, já que também utiliza o vaso para o número dois. O número dois, no entanto, é normalmente em casa. Em banheiros mais gerais, apenas a solidariedade faz o homem suspender a tampa de baixo na hora de urinar.

Muito bem: o homem se aproxima, urina e vai embora. Não abaixa a tampa. Porque não se lembra.

Já a mulher, esse ser de anatomia diversa e deveras mais interessante, utiliza o vaso sempre em posição vulnerável. Aliás, parece mesmo que a mulher foi desenhada pelo criador para assumir posições vulneráveis. Provavelmente é ponto pacífico que são essas as melhores posições para as mulheres. É nessas posições em que a mulher se mostra mais mulher. Vulnerável.

Pois a mulher assume a posição vulnerável sobre o vaso, independente da função fisiológica que pretenda desempenhar. Assume o trono em movimento curvilíneo, descendo a calcinha até as canelas.

No universo feminino, uma tampa de vaso jamais é levantada. Não faz sentido para uma mulher levantar a tampa de um vaso, a menos que vá realizar ali uma faxina.

Sendo assim, um homem que deixe o local da função distraído vai abandonar a tampa do vaso levantada. Já uma mulher, na mesma situação, vai esquecê-la abaixada.

Mulheres tendem a defender a idéia de que deixam a tampa abaixada porque são mais civilizadas. Na verdade, fazem isso não por consciência, mas justamente pelo mesmo motivo que leva o homem a deixá-la levantada: distração. Acabaram, passam o papelzinho e vão embora.

Muitas chegam ao requinte de abandonar um bolinho de papel sobre a água, como um úmido origami que flutua sobre um lago plácido após ter navegado pelas mais belas e recônditas paragens. Diga-se inclusive que é a inspiração poética que qualquer resquício de mulher provoca nos homens que nos reprime de devolver as insinuações maldosas sobre nossa higiene pessoal.

Qualquer resto deixado por mulher tem uma mágica, uma aura, uma intocabilidade.

Já sobre o hábito de pedirem, exigirem, reclamarem, pleitearem com indignação que seus companheiros masculinos deixem a tampa abaixada após o número um, aí é a velha questão de que a mulher quer a igualdade, mas, é claro, quer que a gentileza, a concessão masculina, se mantenha acima disso.

Funções fisiológicas são automáticas. Não são involuntárias, mas concordemos que beiram a incontrolabilidade. Mesmo quando a sociedade se movimenta no sentido de limitá-las, de cerceá-las, quando não apenas descobre noções pragmáticas de higiene mas também inventa regras de etiqueta, há sempre o momento em que o corpo se entrega ao deleite de cumprir alguma missão inegociável e intransferível que lhe tenha sido destinada.

É nessa hora que qualquer impasse ou politicamente correto desce rodando em círculos.


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